maitan
drama
prosa
verso
amores crônicos
contratempo
prosa
amores
crônicos
TORNAR-NOS

Eu quero te sentir a carne usada. O cansaço do teu sexo. O teu sexo, teu nexo. A tua animalidade. Doar teu corpo a mim. Doer meu corpo em ti. Fazer um banquete de si. Exalar seu cheiro, suar sua pele. Morrer sem descobrir que não há depois. Que o que sobrou de tudo foi nós dois. Dos corpos que nos fizeram. E de repente ninguém mais. Nem nós mesmos.

Mas a vida não deixa a morte sobreviver.

Eu quero te levar embora. Em boa hora, qualquer. Te lembrar. Te trazer para sempre. Pro que der. E vier de onde só a gente entende. O lugar que só a gente habitou. A casa secreta onde a gente morou. Por anos. Horas. Segundos. Te levar pro meu mundo. Te estender para o todo. E te encontrar em cada rosto desconhecido. Saber que de ti, só eu.

Que a paixão é um levante. Uma revolução que fracassa. Alguma hora de eternidade.

Enlouquecer nos teus cabelos. Salivar teu peito. Te existir por dentro. Eu quero-te encontrar-me. Ver-te me achar. Ter-me seu. Ser-te mais. Te querer-me só. Respirar-nos.

Que cada inspiração é a primeira, e toda expiração é a última.

Continuar, nessas palavras mortas. Esperar até alguém me dizer. Até alguém nos falar. Reclamar a nossa ausência. Viver na voz, na respiração, no olhar de quem vê. Guardados aqui, onde nada pode nos esquecer, senão o próprio esquecimento. Fazer-nos letras, signos, pontos. Prontos para ser história. Sucumbir no infinito. Encher de memória o vazio.

Que sonhar é olhar a nuvem e enxergar a chuva.

Eu quero agora, nesse instante. Só te olhar. Dormir. Esperar. A vida te levar pra longe. Lá, longe. Distante. Perdida. Dentro de mim.